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A forma como registro: Pietro Oliveira faz da Caboco um oásis de afeto no design brasileiro

Nas madeiras robustas e nas linhas elegantes das peças da Caboco Design está guardada sua força: algo imaterial que se expressa no objeto. Conhecimento feito de gente no correr do tempo, gregário e rico. Cada móvel como uma cápsula de afetos e da lida, dos ofícios aprendidos e elaborados durante muitas vidas. 

A Caboco é um estúdio de design fundado em 2018, em Belo Horizonte (MG), e que resume seu intento no slogan: “O design do interior”. Com peças assinadas pelo designer industrial e de produto Pietro Oliveira, é construída a muitas mãos. O mobiliário é feito em um sistema consecutivo e viaja de um ateliê, garagem, casa, oficina a outro, após cada etapa realizada. São 14 artesãos especialistas em seus ofícios da marcenaria à tecelagem, na grande BH e interior, em uma rede de conhecimentos e arte.

Pietro Oliveira Caboco Design
A poltrona Tiquin (82x82x75cm), apresentada em maio, na MADE 2022.

“Não fazia sentido pra mim ter uma marca que chamasse ‘Pietro Design’, porque a minha construção como pessoa vem de muitas outras pessoas que não são Pietro, este que pode falar hoje. Essa relação de incorporar os saberes do território é uma busca pela identidade desses que vieram antes e junto a mim”, enfatiza Pietro.

Ir longe, para descobrir o Brasil

A Caboco começou a surgir longe do Brasil, alguns anos antes, quando o designer fazia parte da graduação na Universidade Victoria, na Nova Zelândia, através do programa Ciência Sem Fronteiras. Foi lá que “na maior síndrome do cachorro vira-lata”, Pietro percebeu a riqueza do que se produzia no país e mergulhou de cabeça no estudo do design e do artesanato brasileiros. 

pietro oliveira caboco design
Luminárias Lampejo (175 cm) e Lampejinho (mesa) levam aço, madeira e tecido na feitura. Sua cúpula oferece múltiplos posicionamentos. A peça de piso foi finalista do 33º Prêmio Museu da Casa Brasileira

Ao voltar com a ideia de realizar algo que representasse mais que sua própria visão de mundo, na Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG), concluiu o curso com um trabalho que mapeava e criava uma rede de artesãos para valorizar esses trabalhos singulares. O pensamento norteador era inverso ao da lógica de custo, buscava agregar valor através do fortalecimento dessa teia com um desenho e um discurso que enfatizasse cada técnica, cada parte da obra. “A Caboco é feita por muitos cabocos”, sintetiza.

Design como ferramenta

Com influências que vão dos teares no interior mineiro ao designer gráfico Alexandre Wollner (1928-2018) e ao casal italiano Lella (1954-2014) e Massimo Vignelli (1931-2014), Pietro entende a forma como algo além do tangível, do que se faz com papel e caneta. 

“É a lógica que o projeto traz – seja para trabalhar com a indústria ou no fabrico artesanal – para que o uso da manufatura e dos materiais seja racional e pensada para cadeia como um todo. A forma vai além da beleza, tem a ver com todas as interações dos nossos sentidos, de como usamos cada peça”, explica. Tal pensamento deriva de uma consciência racionalista trazidas pelas escolas alemãs de Ulm e da Bauhaus, bem como do movimento Modernista no Brasil.

Todavia, Pietro vê a potência do design brasileiro – incluindo o que faz – ser, sobretudo, alimentada por esses ofícios centenários que se mantêm vivos de forma contemporânea às novas tecnologias. Ela vem da raiz, dos processos artesanais e intrínsecos ao território em uma pluralidade de referências que foram ressignificadas e não apenas mimetizadas e que fazem do Brasil um celeiro criativo único no mundo. 

Pietro Oliveira Caboco Design
Poltrona Pachá (105x88x120 cm) tem estrutura de aço e madeira maciça com possibilidade de estofamentos em couro ou tecido, tudo feito artesanalmente

Nessa toada é que, através da Caboco e da rede de artesãos, Pietro quer ajudar a construir uma memória concreta e evitar o apagamento de saberes e histórias ancestrais, como o vivido continuamente pela cultura afro-brasileira.

“O design é uma ferramenta. Fazer design de produto é escrever no tempo, porque o objeto, muitas vezes, dura mais do que a vida de quem o fez. É interessante observar um pensamento bastante comum ‘de que um preto não faz nada sozinho. O feito, a vitória de um preto é a vitória de todos’. A gente vive um processo diaspórico, onde nossa história e identidade vêm de um processo de exploração, no qual os nossos ancestrais tiveram suas identidades roubadas. Mas dessa tragédia, sobrou manifestações culturais riquíssimas, porque elas foram necessárias para a sobrevivência das pessoas”, enfatiza o designer.

Conhecimento e pluralidade

Pietro é um homem negro. Um dos poucos em uma área majoritariamente composta por uma fatia social branca, masculina e com bom poder aquisitivo. Ele vê uma mudança lenta na cena, tornando-a mais plural, por uma exigência do momento histórico e social. Pessoas trans, negras e mulheres ganharam visibilidade nos últimos anos e houve – neste último caso -, inclusive, um resgate de nomes que foram icônicos para a história do design nacional.

 

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Das mãos habilidosas e das oficinas dos artesãos saem as peças feitas pela Caboco, Pietro reuniu 14 profissionais na grande BH e cidades do interior.

 

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Para Pietro, porém, a questão é mais ampla e passa pela formação e pelo conhecimento. Assim, a conquista da oportunidade progressista que beneficiou uma gama plural de pessoas está diretamente ligada ao acesso a educação. Por outro lado, se houve um crescimento do número de pessoas fazendo design de qualidade e há certa pluralidade, ainda é muito insípida a cultura geral sobre o que é design para além do consumo em si. Segundo o designer, o ideal seria que a possibilidade de compra e a valorização sobre a criação e a feitura do objeto estivessem caminhando em pleno compasso. “Se vivêssemos em um lugar menos desigual, isso seria mais fácil”, completa. 

Para saber mais sobre o trabalho de Pietro Oliveira na Caboco Design, acesse ocaboco.com.

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